Corpos em Contenção
O corpo negro cai —
e o chão já sabe o nome.
A bala, não.
119 mortos.
E o noticiário sorri:
teve gol do Flamengo,
teve festa,
teve circo.
Enquanto o morro sangra em silêncio,
o país bate palma pra tragédia.
“Eles escolheram o resultado”,
diz o homem fardado,
como se a morte fosse escolha
e o racismo, coincidência.
Eu sou negro.
E podia ser eu.
Podia ser o corpo caído,
confundido com ameaça,
com usuário,
com bandido,
com qualquer rótulo que justifique o tiro.
Mas eu falo —
porque ainda respiro,
porque o cuidado também é trincheira.
Sou Redutor de Danos,
e sei que cada corpo vale.
Cada pedra, cada seringa, cada escolha,
traz uma história que o Estado não quer ouvir.
Eles chamam de guerra,
mas é genocídio.
Chamam de limpeza,
mas é epistemicídio.
Matam o corpo,
matam o saber,
matam o direito de existir
fora do padrão.
E eu lamento.
Lamento por mim,
pelos meus,
pelos que ficaram no chão,
pelos que o crack não matou,
mas a polícia sim.
Pão e circo.
Sangue e selfie.
A distração que alimenta a barbárie.
Corpos negros,
em fila,
em fuga,
em fé.
E eu sigo,
com a palavra como escudo,
com o cuidado como arma.
Porque viver — pra nós —
é sempre ato político,
e resistir,
é a forma mais bonita
de dizer:
ainda estamos vivos.
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